Novembro 21, 2024
A Castinga é lar para uma gama de mais de 6.300 espécies, das quais 2.700 são endêmicas (Foto: Divulgação)
Por Chau Kuo Hue
De acordo com a agência de clima europeia Copernicus, a temperatura média global ao longo de 2024 foi recorde, comparando-se todos os anos desde 1940. Os dados da Copernicus apontam que a atmosfera ficou em torno de 1,64ºC acima das médias compreendidas entre 1850-1900, e 0,76ºC maior se comparado ao período 1991- 2020, em todos os meses durante o primeiro semestre do ano.
Como uma das consequências das elevadas temperaturas que recaíram sobre um grande conjunto de países, labaredas acabaram consumindo florestas e outros valiosos biomas, agravando ainda mais uma situação ambiental que já é historicamente crítica.
No Brasil, lamentavelmente, a conjuntura não é distinta se comparada ao que se observa no mundo. Segundo informações do Programa Queimadas, do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia, no país foram registrados, de janeiro até a metade de outubro de 2024, mais de 226,6 mil focos de incêndio. A Amazônia foi onde houve a maior frequência de queimadas (49,4%), seguida pelo Cerrado (32,1%) .
Apesar da Caatinga ter registrado um número menor de focos, o bioma merece olhar atento. Assim como a floresta Amazônica, a Caatinga abrange cerca de 10% do território nacional, e tem tamanho próximo ao da Turquia. O ecossistema é lar para uma gama de mais de 6.300 espécies, das quais 2.700 são endêmicas. Ao mesmo tempo, de acordo com o último censo organizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2017 havia 1,7 milhões de agricultores familiares dependentes da fauna e flora local para subsistência.
Conforme o Mapbiomas, entidade formada por ONGs, universidades, laboratórios e startups, o bioma da Caatinga está em fase de degradação desde 1985, em boa parte devido à ação humana. Como resultado deste processo que se estende há bastante tempo, a equipe do Mapbiomas já está identificando pontos de desertificação, o que torna certos locais inabitáveis para espécies em geral.
Estudo editado em 2023 por acadêmicos de diversas universidades do Brasil, e publicado no Journal of Ecology, demonstra que, caso a tendência de deterioração na Caatinga permaneça, em 2060 muitas espécies de plantas deixarão de existir.
A Caatinga também é o berço da produção de iguarias únicas, como o mel de aroeira, que é livre de resíduos e movimenta a geração de renda de cerca de 23 mil famílias de apicultores – apenas para dar um exemplo do que podemos estar abrindo mão no futuro.
Assim, por mais que devamos ter grande preocupação com os focos de incêndios na Amazônia e no Cerrado, não podemos deixar de olhar para outros biomas, como a Caatinga. As mudanças climáticas também têm afetado a Mata Atlântica e o Pantanal. Todos passam por processo de degeneração, e os focos de incêndio atuais têm acelerado um processo que todos temos consciência de que devemos parar. Caso contrário, em 2060, podemos estar diante de um cenário muito pior, em que as simulações realizadas e divulgadas no Journal of Ecology tenham , de fato, se concretizado.
As tecnologias, inovações ou hackathons têm trazido importantes avanços na produtividade e custos logísticos da agricultura mundial, que diretamente impactam o preço dos alimentos ao consumidor. Não podemos deixar de lado quão relevantes podem ser essas mesmas aplicações para os biomas como a Caatinga.
Chau Kuo Hue é Country Manager da Ethikabio. Trabalhou no setor financeiro e na indústria de alimentos, além de consultor econômico.