Fevereiro 15, 2022
Por Marina Salles e Vitor Lima
Posicionar uma empresa como parceira de escolha das startups não é tarefa fácil no ecossistema de inovação. Mas, como em qualquer relacionamento, um guia de boas práticas pode ajudar nessa missão.
Mas, afinal, você já ouviu falar em “parceiro de escolha”? Esse tipo de parceiro é aquele: (1) com quem as startups querem cooperar; (2) que tem um histórico positivo ao longo do tempo; (3) que, no boca a boca, acaba virando referência entre os empreendedores e tende a ser a empresa escolhida para co-desenvolver e escalar diferentes soluções.
Neste artigo, baseado no episódio Boas práticas na cooperação com startups do AgTech Garage Podcast, Bruno Abreu, Líder do time de Gestão de Inovação do AgTech Garage, destaca as principais frustações que cercam o relacionamento entre grandes empresas e startups e os comportamentos que geram os melhores resultados.
“Mais do que um produto, costumo dizer que toda startup tem um sonho”, diz Abreu. E um passo importante para construir uma via de mão dupla com as startups é identificar seu “sonho grande” e, quem sabe, ajudar a alcançá-lo.
Bruno Abreu, líder de Gestão da Inovação no AgTech Garage
Da ótica da startup, o interesse em se relacionar com grandes players do mercado pode variar muito, conforme seu estágio de desenvolvimento. Entre as mais jovens, as parcerias costumam ser muito bem-vindas para testar e adequar novos produtos às necessidades do mercado. Mas uma startup madura também pode querer co-desenvolver uma solução para atacar novas fronteiras.
A parceria entre grandes companhias e startups também é um dos mecanismos para acelerar o ganho de escala de negócios disruptivos que já conquistaram os primeiros clientes, mas têm capital limitado para uma expansão. Independentemente do caso, o interesse da startup precisa estar claro, para a relação fluir com transparência.
Do lado da grande empresa, ter uma posição privilegiada no ecossistema de inovação é fundamental para não perder o compasso da mudança num mundo cada vez mais acelerado. O ganho de competitividade no mercado, acesso à oferta de novas tecnologias, melhoria de processos internos e oportunidade de aquisição de negócios inovadores são alguns dos exemplos das vantagens que a aproximação com as startups pode trazer.
No AgTech Garage, a Suzano é uma empresa que recebe diversos elogios da comunidade de startups pela forma como estruturou seus processos de inovação aberta. “Toda empresa ou startup tem uma reputação no mercado, e estes relatos reforçam a sua imagem positiva”, diz Abreu. (Leia mais sobre A essência ágil do processo de transformação digital da Suzano).
Na cooperação entre grandes empresas e startups uma pergunta que não pode ficar sem resposta é: qual problema está sendo resolvido? E quais as expectativas da empresa em relação à solução no curto e médio prazos?
Depois, no caso de ser necessária uma Prova de Conceito (POC) ou desenvolvimento de um Produto Mínimo Viável (MVP) — leia mais sobre POCs e MVPs — a pergunta é: o que será medido? É importante definir parâmetros para os projetos caminharem e poderem escalar. E, lembre-se, o fit entre a oferta e a demanda pode ser um divisor de águas no sucesso da interação!
Nesse sentido, a capacidade de atendimento da startup também deve ser levada em consideração e ficar clara desde o início da parceria. Abreu conta o caso de uma startup que perdeu uma grande oportunidade de negócio por esta falta de clareza dos dois lados. “O caso foi de uma parceria que começou muito bem, com a startup fazendo testes em 5 máquinas de uma grande empresa. Tudo parecia certo, mas os problemas apareceram quando a tecnologia teve que ser escalada para 800 máquinas. A capacidade de atendimento da startup e a demanda da empresa não estavam bem alinhadas e o acordo se quebrou”, conta. Por essas e outras, entender minimamente as etapas do ganho de escala ajuda a equilibrar as possibilidades de ambas as partes.
Em um exemplo de sucesso, vencedor do AgTech Garage Awards 2021, a startup Elysios conseguiu atender de forma coordenada às necessidades do Sicredi. Partindo de um piloto para implantação de um caderno de campo digital na fazenda de 30 produtores de uva, a agtech escalou a solução para 500 produtores de 10 cooperativas ligadas à instituição financeira num momento seguinte.
Uma preocupação recorrente das grandes organizações é relativa ainda à segurança e sigilo de dados. Para estabelecer uma parceria saudável, vale conhecer o time de empreendedores por trás da tecnologia e se certificar da idoneidade do negócio.
“Toda startup precisa estar muito bem assessorada juridicamente e aquelas que trabalham de forma correta também têm a preocupação com a segurança de dados e informações relativas à sua área de desenvolvimento”, afirma Abreu.
Deixar qualquer startup em banho maria é uma péssima ideia quando se quer construir uma boa reputação no ecossistema. Uma boa cadência de decisões, portanto, deve fazer parte do planejamento da grande empresa, assim como a disposição para dar feedbacks construtivos quando um “pitch” não vai para frente.
Também no contexto de decisões cadenciadas, a grande empresa precisa definir um objetivo final e ter em mente que as startups não são fábricas de software. A customização de soluções deve ser avaliada caso a caso e tem suas limitações.
“Toda grande empresa tem nas mãos a possibilidade de ajudar, e muito, qualquer startup. Mas ajudar não significa engolir o negócio do outro”, diz Abreu. A regra chave é estabelecer relações de ganha-ganha. “Cooperação no ecossistema é sinônimo de diálogo, e exige respeito mútuo para fazer a transformação acontecer”, acrescenta.
Qual investimento a grande empresa está disposta a fazer no teste de uma nova solução? E qual sua margem de manobra quando as coisas não dão exatamente certo? O processo de inovação tem risco envolvido e é comum os projetos bem-sucedidos pagarem os investimentos não tão bem-sucedidos assim.
O Google mesmo tem um site em que compila todas as suas iniciativas que deram errado. E o nome do site não poderia ser melhor: “Killed by Google”. Lá, a empresa lista, orgulhosamente, as soluções que criou, investiu, desenvolveu e matou.
Para uma empresa focada em inovação, é motivo de orgulho mostrar os investimentos da sua jornada, incluindo os que não tenham saído como planejado num primeiro momento. Vale lembrar ainda: todo resultado pode ser revisado e aproveitado no futuro. O que não existe é inovação sem investimento.